segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Férias

procura-se
indivíduo sensível
inteligente
ligeiramente indecente
que trabalhe full time
sem ganhar muito
que não seja feliz
mas tenha lampejos
de felicidade
e seja independente
precisa-se urgente
de alguém assim
que me cubra
- estou tirando férias de mim mesmo



segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

The Little Cat


There once was a little cat. This was a wise little cat, who had been left to fend for itself many times. Home to home, place to place, he led a transitory life, having lost his home at an early age, he longed for a place where he could feel secure but had experienced enough to know when the place he was staying was unsafe. The cat moved to a strange new part of the city - there were fast cars, loud people, and small gates around every garden. It wasn't like the places he used to live. The people here were rude, rarely stopping to pet or feed the little cat. The cat grew thin and lonely. One day, the cat saw a man who was new in town. Filled with the desperation that loneliness in an unknown place can bring, The cat ran up and grazed the back of the handsome stranger's legs. The man stopped, only intending to play with the cat for a little while but when their eyes met, something marvelous happened. The handsome stranger brought the cat home with him. He fed the little cat. They ate together, and when they were done, the man would tenderly hold the little cat close to him, as if trying to pull in the warmth from the cat's fur. The cat stayed a few days, finding solace in being held so close. Days became weeks. The small, abandoned cat felt he had finally found a home. Warmth, food, affection, a place to curl up at night. "Gatinho, I love you." The handsome stranger would say, and held the little cat through the night. Soon the stranger spent all of his free time with the little cat. The cat knew this was a busy man, with lots of important things to do, so the cat happily savored what little time the stranger would give to him. And though the little cat felt safer here than he had ever felt in his life, he still wondered if he would lose this home he had once dreamt of, this man that he loved. Time flew by, and though their life together became more routine, the cat and the handsome stranger had many wonderful times together. The stranger was from a very warm place, and had never seen snow. The first day it snowed in the city, the man ran smiling through the streets, gazing towards the sky with childlike wonder. The cat purred. "Am I your one and only?" The cat would ask the man at night. "Of course, Gatinho," the man would reply. "It's silly to even ask." "Will I be with you always?" The cat waited for an answer, but never found one that vanquished his fears. Nonetheless, the little cat was certain that this was the home he had longed for his whole life. Every so often the man grew tired of the frightened little cat's questions, and would leave the cat to sleep alone. This was very infrequent, however, and the cat was sure that everything was alright. One look in the man's eyes. Is all it took for the cat to feel at peace. And though the cat wondered at times If he could smell other cats that had seen the man, cafuné erased all these thoughts. But one day the cat was quite sure-the scent was overpowering. The man denied it up and down, saying anything and everything he could to make the cat feel better. These lies hurt the cat the most. It was so obvious what had happened. The cat looked back at the man, at the eyes that had once fixed upon his in an adoring gaze The little cat saw only eyes filled with loss and fear of loneliness; the love had gone out of them. The cat was torn between sadness and rage, and tried to eliminate any reminder of the stranger. He shook his head, yearning to rid his mind of the hopes that were dashed. But a strong mind is more often a curse than a blessing, and every happy memory was like a blade, which carved up the little cat's dream. And though the man pleaded. The little cat knew he would never feel safe. The cat left. He hoped that someday he would find a home very much like this. But he could no longer trust this stranger that he loved. And though he would miss the man terribly, the pain was too much to bear. The cat resolved to learn to feel safe on his own before. He would ever trust another man to take care of him. The cat knew he would have a safe, happy home one day, But until he finds someone to love him solely and fully, Le petit chat pleure sans cesse.

_________________________________

This time you're wrong, Little Cat.
The strange man loves you more than you can imagine.

domingo, 20 de dezembro de 2009

sábado, 19 de dezembro de 2009

Nevasca


Hoje acordei e quebrei seu coração. O meu foi junto, não se engane. Sobrou pouco. Sobrou nada. Fiapo de gente que lamenta as burradas que faz. Nem sabe aproveitar o que te dão de graça. Agora fico aqui tentando colar os pedaços. Tentando fazer você aceitar um coração remendado, enquanto merecia ter um inteiro e são. Amanhã vai ter nevasca. Mas você não vai estar rindo de mim enquanto eu corro pela neve branca. E eu vou estar na rua fria, chorando, esperando minhas lágrimas congelarem enquanto (eu sei) você também chora.

Necessito

de
sorvete
de
morfina
urgente

sábado, 21 de novembro de 2009

musiké

tenho pavor de festinhas
aparo as arestas da farsa
visto minha roupa nova
mas hoje não saio de casa


Angélica Freitas
(in Rilke shake, Ed. 7Letras/Cosac Naify, 2009)

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

3.

Não é por me gavar
........................mas eu não tenho esplendor.
Sou referente pra ferrugem
........................mais do que referente pra fulgor.
Trabalho arduamente para fazer o que é desnecessário.
O que presta não tem confirmação,
........................o que não presta, tem.
Não serei mais um pobre diabo que sofre de nobrezas.
Só as coisas rasteiras me celestam.
Eu tenho cacoete pra vadio.
As violetas me imensam.

Manoel de Barros
(Desejar ser, in Livro sobre Nada, Ed. Record

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Há milênios...

.
não aparece um poema por aqui... hoje lembrei do meu soneto preferido.


Sonnet XVIII
(W. Shakespeare)

Shall I compare thee to a summer's day?
Thou art more lovely and more temperate:
Rough winds do shake the darling buds of May,
And summer's lease hath all too short a date:

Sometime too hot the eye of heaven shines,
And often is his gold complexion dimmed,
And every fair from fair sometime declines,
By chance, or nature's changing course untrimmed:

But thy eternal summer shall not fade,
Nor lose possession of that fair thou ow'st,
Nor shall death brag thou wander'st in his shade,
When in eternal lines to time thou grow'st,

So long as men can breathe, or eyes can see,
So long lives this, and this gives life to thee.

domingo, 1 de novembro de 2009

Washington DC, 31 de outubro, 2009

Sorvete de morfina é para os dias mais difíceis e amargos. Há um ano, doía tanto não ser amado que precisei de um vício novo que me deixasse anestesiado. Não havia endorfina, chocolate ou porre que desse jeito. Sorvete de morfina aliviou a dor, diminui meu medo. Ficou uma marca. Nunca mais olhei o mundo do mesmo jeito. Depois de tanto sorvete, recuperei um pouco da humanidade. Andava perdida em um buraco escuro em mim. Usei. Abusei. Aumentei a fábrica. Fiz mais sorvete. Desde então vivo de morfina em doses terapêuticas, prescritas como sorvete. Devagar acerto a dose. Para aliviar. Sem parar de respirar.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Ouvindo... (para os desiludidos com a espécie)


.
Human Behaviour
(Bjork)
.

If you ever get close to a human
And human behaviour
Be ready to get confused

There's definitely no logic
To human behaviour
But yet so irresistible

There is no map
To human behaviour

They're terribly moody
Then all of a sudden turn happy
But, oh, to get involved in the exchange
Of human emotions is ever so satisfying

There's no map and
A compass
Wouldn't help at all

Human behaviour

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Meninos, meninas e indecisos: eu vi (e fui)...


Eu odeio a América e isso já não é mais segredo.
Mas tem coisas que a gente precisa aprender com eles...








"All means All"
Equality NOW

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Ouvindo...


.
O quereres
(Caetano Veloso)
.

Onde queres revólver, sou coqueiro
E onde queres dinheiro, sou paixão
Onde queres descanso, sou desejo
E onde sou só desejo, queres não
E onde não queres nada, nada falta
E onde voas bem alto, eu sou o chão
E onde pisas o chão, minha alma salta
E ganha liberdade na amplidão

Onde queres família, sou maluco
E onde queres romântico, burguês
Onde queres Leblon, sou Pernambuco
E onde queres eunuco, garanhão
Onde queres o sim e o não, talvez
E onde vês, eu não vislumbro razão
Onde o queres o lobo, eu sou o irmão
E onde queres cowboy, eu sou chinês

Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor

Onde queres o ato, eu sou o espírito
E onde queres ternura, eu sou tesão
Onde queres o livre, decassílabo
E onde buscas o anjo, sou mulher
Onde queres prazer, sou o que dói
E onde queres tortura, mansidão
Onde queres um lar, revolução
E onde queres bandido, sou herói

Eu queria querer-te amar o amor
Construir-nos dulcíssima prisão
Encontrar a mais justa adequação
Tudo métrica e rima e nunca dor
Mas a vida é real e de viés
E vê só que cilada o amor me armou
Eu te quero (e não queres) como sou
Não te quero (e não queres) como és

Ah! Bruta flor do querer
Ah! Bruta flor, bruta flor

Onde queres comício, flipper-vídeo
E onde queres romance, rock’n roll
Onde queres a lua, eu sou o sol
E onde a pura natura, o inseticídio
Onde queres mistério, eu sou a luz
E onde queres um canto, o mundo inteiro
Onde queres quaresma, fevereiro
E onde queres coqueiro, eu sou obus

O quereres e o estares sempre a fim
Do que em mim é de mim tão desigual
Faz-me querer-te bem, querer-te mal
Bem a ti, mal ao quereres assim
Infinitivamente pessoal
E eu querendo querer-te sem ter fim
E, querendo-te, aprender o total
Do querer que há e do que não há em mim


quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Quinta-feira

.
Querido Diário,
.
acordei atrasado.
não quero ir trabalhar.
a holandesa me odeia.
é mútuo.
a vida está uma merda.
acho que vou me mudar para Paris.
se a vida continuar uma merda
pelo menos
é Paris.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Definições XVIII

.
Indefinição é quando você não encontra o significado da palavra no dicionário. Ou quando há vários significados e você não sabe o que fazer com eles. Definir é uma tentativa de aprisionar a idéia a um objeto. Fazer algo que só existe na sua cabeça tornar-se real. Apropriar-se do conteúdo imaterial das coisas para construir o seu mundo. Por isso a indefinição é uma sensação tão ruim. Só quando ela surge é você descobre é que todas as suas definições deixaram de existir, ou perderam o sentido. Para continuar vivendo terá que construir (ou definir) tudo de novo.

Ouvindo...


.
Volcano
(Damien Rice)

Don't hold yourself like that
You'll hurt your knees
I kissed your mouth and back
But that's all I need
Don't build your world around volcanoes melt you down

What I am to you is not real
What I am to you you do not need
What I am to you is not what you mean to me
You give me miles and miles of mountains
And I'll ask for the sea

Don't throw yourself like that
In front of me
I kissed your mouth your back
Is that all you need?
Don't drag my love around volcanoes melt me down

What I am to you is not real
What I am to you you do not need
What I am to you is not what you mean to me
You give me miles and miles of mountains
And I'll ask for what I give to you
Is just what i'm going through
This is nothing new
No no just another phase of finding what I really need
Is what makes me bleed
And like a new disease she's still too young to treat
Volcanoes melt me down
She's still too young
I kissed your mouth
You do not need me

sábado, 26 de setembro de 2009

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

A bruxa

Nesta cidade do Rio
De dois milhões de habitantes
Estou sozinho no quarto
Estou sozinho na América.

Estarei mesmo sozinho?
Ainda há pouco um ruído
Anunciou vida a meu lado.
Certo não é vida humana,
Mas é vida. E sinto a Bruxa
Presa na zona de luz.

De dois milhões de habitantes!
E nem precisava tanto...
Precisava de um amigo,
Desses calados, distantes,
Que lêem verso de Horácio
Mas secretamente influem
Na vida, no amor, na carne.
Estou só, não tenho amigo,
E a essa hora tardia
Como procurar amigo?

E nem precisava tanto.
Precisava de mulher
Que entrasse nesse minuto,
Recebesse esse carinho
Salvasse do aniquilamento
Um minuto e um carinho loucos
Que tenho para oferecer.

Em dois milhões de habitantes
Quantas mulheres prováveis
Interrogam-se no espelho
Medindo o tempo perdido
Até que venha a manhã
Trazer leite, jornal, calma.
Porém a essa hora vazia
Como descobrir mulher?

Esta cidade do Rio!
Tenho tanta palavra meiga,
Conheço vozes de bichos,
Sei os beijos mais violentos,
Viajei, briguei, aprendi
Estou cercado de olhos,
de mãos, afetos, procuras

Mas se tento comunicar-me,
O que há é apenas a noite
E uma espantosa solidão

Companheiros, escutai-me!
Essa presença agitada
Querendo romper a noite
Não é simplesmente a Bruxa.
É antes a confidência
Exalando-se de um homem.

C.D.A
(José e Outros, in Poesia Completa, Ed. Nova Aguilar, 2006)

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

idéias mortas

as idéias andam fugindo
de mim
mudando de calçada
.
se me vêem
na rua
da amargura
.
e do completo
branco omo total

atravessam sem olhar
para os lados

preferem a brutalidade
do atropelamento

a fazer parte
do meu arsenal

de bobagens

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Ouvindo...

Frase do dia, digo, da noite

.
"Meu coração é uma máquina de escrever.
É só você bater para entrar na minha história."
.
(de Máquina de Escrever, com Pedro Luís e a Parede,
composição de Mathilda Kovak e Luís Capucho)

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Soneto do Suicida Bêbado

Ah ah ah, hoje eu só quero me matar
Preciso achar um jeito dessa vida acabar
Pode ser com canivete, corda, faca, ou veneno
Pode ser pela janela do décimo-quinto andar
.
Não preciso de ajuda, só preciso de um momento
Quem sabe esperar um vento que me ajude a saltar
Sem vento resta o veneno, quem sabe chumbinho tento
ou mais morfina do que aguento, para parar de respirar
.
Pode parecer delírio, mas isso aqui não é o lírio
Não preciso de colírio, o que eu quero é veneno
Para preparar o terreno e então morrer sereno,
com um último aceno, sem ninguém me incomodar
.
E no enterro tragam flores, girassóis, alguns amores
Não chorem, não sintam dores, eu morri de tanto amar.

Ouvindo...



Não é fácil
(Marisa Monte, Carlinhos Brown, Arnaldo Antunes)

Não é fácil
Não pensar em você
Não te contar meus planos,
Não te encontrar
.
Todo dia de manhã
Eu tomo meu café amargo
É, ainda boto fé de um dia
te ver ao meu lado
Na verdade, eu preciso aprender
Não é fácil, não é facil
.
Onde você anda, onde está você?
Toda vez que eu saio
eu me preparo prá talvez te ver
Na verdade eu preciso esquecer
Não é fácil, não é fácil
.
Todo dia de manhã
Eu tomo meu café amargo
É, ainda boto fé de um dia
te ver ao meu lado
O que eu faço?
O que eu posso fazer?
Não é fácil, não é fácil
.
Se você quisesse ia ser tão legal
Acho que eu seria mais feliz do que qualquer mortal
Na verdade, não consigo esquecer
Não é fácil, é estranho

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

O Frenesi de Agosto


Com muito desgosto, imensa saudade, coração apertado e um pouco de esperança no bolso, começou agosto. Sem casa, sem gato, sem piano, sem amor, sem amigos. O Bloco do Eu Sozinho saiu comigo mesmo. Mesmo sem nada concreto, fui atrás dos poetas. Eles mudaram de língua. Só falam comigo em Inglês. E esperam que responda à altura. Bishop. Yeats. Keaton. Dickson. Whitman. Antes de achar uma casa, achei um sebo (oba!) e uma boa livraria. Requisitos fundamentais para quem não gosta de comprar livro pela internet. Não foi difícil encontrar um lugar para morar. 2144 California St NW. Onde mais poderia morar senão na unica saída do metrô onde está gravado um verso de um poeta? "I celebrate myself, and sing myself, and what I assume you shall assume. For every atom belonging to me as good belongs to you." Difícil foi conter as saudades da Rua Tonelero, da esquina do metrô, da academia lotada, do sorvete de amarena da esquina da Santa Clara, do Café no Santa Satisfação. Dos amigos. Dos amigos. Dos amigos. Do seu sorriso e das suas mensagens no final do dia também. Do miado chato do meu gato pardo quando acorda com a cara amarfanhada. Do som do meu piano com seu dó mais grave desafinado e um leve soar metálico quando tocava Debussy. Viagens e surtos. Sagalusa e o Diário de Camus. Em alguns momentos confesso que surtei. Descobri a definição de estrangeiro. Fiquei assustado. Nada que o correr dos dias e as saídas noturnas não amenizassem. E com uma casa nova tudo ficou mais fácil. Depois, conseguir móveis. Finalmente as malas desfazem-se. Os livros aparecem. Tudo fica mais familiar, embora ainda falte muita coisa para chamar isso de lar. Não sei porque, mas o diabo mora nos detalhes vermelhos da minha sala. De vez em quando a gente conversa. Ele avisa: fica tranquilo que essa nova vida está só começando; vem muito mais por aí.
.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Há 110 anos atrás...

... nascia Borges. Abrindo ao acaso saiu o poema que transcrevo abaixo.

.

meus livros
.
Meus livros (que não sabem que eu existo)
São tão parte de mim como este rosto
De fontes grises e de grises olhos
Que inultimente busco nos cristais
E que com a mão côncava percorro.
Não sem alguma lógica amargura
Penso que as palavras são essenciais
Que me expressam se encontram nessas folhas
Que não sabem quem sou eu, não nas que escrevi.
Melhor assim. As vozes dos mortos
Vão me dizer para sempre.

Jorge Luís Borges
(A Rosa Profunda, in Borges - Poesia. Ed. Cia das Letras. Tradução Josely Vianna Baptista.

Ouvindo...


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Tempos Modernos
(Lulu Santos)
.
Eu vejo a vida
Melhor no futuro
Eu vejo isso
Por cima de um muro
De hipocrisia
Que insiste
Em nos rodear...
.
Eu vejo a vida
Mais clara e farta
Repleta de toda
Satisfação
Que se tem direito
Do firmamento ao chão...
.
Eu quero crer
No amor numa boa
Que isso valha
Pra qualquer pessoa
Que realizar, a força
Que tem uma paixão...
.
Eu vejo um novo
Começo de era
De gente fina
Elegante e sincera
Com habilidade
Pra dizer mais sim
Do que não, não, não...
.
Hoje o tempo voa amor
Escorre pelas mãos
Mesmo sem se sentir
Não há tempo
Que volte amor
Vamos viver tudo
Que há pra viver
Vamos nos permitir...
.
Eu quero crer
No amor numa boa
Que isso valha
Pra qualquer pessoa
Que realizar, a força
Que tem uma paixão...
.
Eu vejo um novo
Começo de era
De gente fina
Elegante e sincera
Com habilidade
Pra dizer mais sim
Do que não...
.
Hoje o tempo voa amor
Escorre pelas mãos
Mesmo sem se sentir
E não há tempo
Que volte amor
Vamos viver tudo
Que há prá viver
Vamos nos permitir...
.
E não há tempo
Que volte amor
Vamos viver tudo
Que há pra viver
Vamos nos permitir...

domingo, 23 de agosto de 2009

Obituário


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Sexta-feira, 21 de agosto, morreu Fulano Sicrano(http://www.naofechemoumquetenha.blogspot.com/). Fulano vinha contribuindo intensamente para a divulgação da música popular brasileira, a nova e a antiga. Através de Fulano, conheci muita gente boa e aumentei meu repertório. Como ele é brasileiro e não desiste nunca, ele diz que volta (http://twitter.com/fulanosicrano). Assim espero. Vida eterna ao Fulano.


sábado, 22 de agosto de 2009

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Asas

no meio de mim
mora um ser alado
que toda hora
tenta sair

antes eu dizia:
sai, meu filho
voa!

agora?

não deixo.
não deixo.
não deixo.

quer voar?
me leva junto.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Ouvindo...



Canto de Xangô
(Vinícius de Moraes & Baden Powell)
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Eu vim de bem longe, eu vim, nem sei mais de onde é que eu vim
Sou filho de rei muito lutei pra ser o que eu sou
Eu sou negro de cor mas tudo é só amor em mim
Tudo é só amor, para mim
Xangô Agodô
Hoje é tempo de amor
Hoje é tempo de dor, em mim
Xangô Agodô
Salve , Xangô, meu Rei Senhor
Salve meu Orixá
Tem sete cores sua cor
sete dias para a gente amar
Salve Xangô, meu Rei Senhor
Salve meu Orixá
Tem sete cores sua cor
sete dias para a gente amar
Mas amar é sofrer
Mas amar é morrer de dor
Xangô, meu Senhor, saravá!
Me faça sofrer
Ah me faça morrer
Mas me faça morrer de amar
Xangô, meu Senhor, saravá!
Xangô agodô

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Definições XVII

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Estrangeiro é quando você olha para o lado e não reconhece nada nem ninguém. É uma sensação de infinita solidão - difícil explicá-la - e que é sempre qualitativa: não depende de quanta gente tem por perto, mas de quem está ao seu redor. O estrangeiro é um estado, não é um ser. Ninguém é estrangeiro ou fica estrangeiro por toda a vida. Aos poucos o corpo começa a aceitar o novo mundo, a ouvir novas palavras, ver gente nova e reconhecer tudo isso como parte dele. Dói, demora, requer paciência. Até que um dia você vê numa porta escrito "push" e ao invés de puxar, você empurra e entra.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Frase do dia, digo, da noite


"Thus in silence in dreams’ projections,

Returning, resuming, I thread my way through the hospitals,

The hurt and wounded I pacify with soothing hand,

I sit by the restless all the dark night, some are so young,

Some suffer so much, I recall the experience sweet and sad"
.
Walt Whitman, 1865
(gravado na pedra, no portal de entrada norte do metrô, em Dupont Circle, Wash DC)
.
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Leaves of Grass (Song of myself)


[I]
I celebrate myself,
And what I assume you shall assume,
For every atom belonging to me as good belongs to
.......you.

I loafe and invite my soul,
I lean and loafe at my ease . . . . observing a spear of
........summer grass.
.
[II]
...
Stop this day and night with me and you shall possess the
.......origin of all poems,
You shall possess the good of earth and sun . . . . there
.......millions of suns left,
You shall no longer take things at second or third
.......hand . . . . nor look through the eyes of the dead . . . .
.......nor feel on the spectres in books,
You shall not look through my eyes either, nor take things
.......from me
You shall listen to all sides and filter them from yourself.
.

Walt Whitman
Song of myself, in Leaves of Grass,
introduction by Harold Bloom, Penguin Classics, 2005)

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

O Frenesi de Julho

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Se o frenesi não fosse literário, mas sexual, julho teria sido um orgasmo múltiplo. Não que tenha sido recheado de leituras excitantes - não li quase nada. Mas foi tanta coisa ao mesmo tempo que ainda estou meio atordoado. Flip. Paraty antes de partir para lembrar. Manuel Bandeira. Uma semana só na companhia de amigos, livros, música e sonhos. Quem precisa de algo mais? Sorvete de morfina. Um biscoito da sorte chinês e profético. Muitos livros na bagagem de volta. Metade do peso devia-se ao Lobo Antunes. Como é belo o Lobo Antunes. E profundo e poético e infinitamente belo. A outra metade a alguns poetas. Companheiros de viagem. Mal deu tempo de desfazer a mala de Paraty - desfazer não, porque não desfaço malas. Elas que desfazem-se sozinhas. Viram pó. Mal as malas desfizeram-se e já era hora de reunir o pó novamente. Despedidas. Despedidas. Despedidas. Eu odeio despedidas. Eu não sei partir. Não aprendi a lição com o aeroporto - talvez por nunca ter morado perto de um. Não sei partir sem medo, sem remorso, sem saudade. Mas só chorei duas vezes. Sou econômico no choro. A primeira, quando me despedi de meus pais. A segunda, lendo um poema para alguém que, sem querer, mas muito feliz, acabei por amar. Aquele mesmo poema sobre a arte de perder, que volta e meia bate na minha porta. A última semana foi difícil. Dizer adeus. Reunir meus pedaços mais íntimos e enfiar numa mala (três...) até não caber mais uma migalha. Tentar, em vão, carregar tudo. Não cabe nas malas e dá vontade de chorar mais. Mas o choro não vem e tanta coisa precisa ser feita que não há tempo para chorar. Último compromisso no Rio: consulta com a astróloga. Uma amiga me diz que "eu fui à astróloga" é uma frase incompatível com a minha boca. Mas eu fui. Juro. E ela mandou eu parar de sofrer. Meu mapa natal aponta para o sucesso e a felicidade. É só não atrapalhar. Chega o dia. Correria. Mal dá tempo de pegar mais uns livros, tocar uma última música ao piano (e lembrar de quando só havia a música e nada mais importava), dizer adeus aos amigos mais queridos. Ia deixar uma carta de boas vindas para o Gato de Alice, num envelope amarelo, mas não deu tempo. Nem de dizer o quanto ele mudou a minha vida. Olho para Borges e eu sei que ele sabe que eu estou indo e que dessa vez, quando a porta fechar, eu não vou voltar por um longo tempo. Ele me olha com seus olhos amarelos e severos. Nós nos entendemos por olhares e miados desde o primeiro dia. Diz que não me preocupe e que cuidará de tudo até eu voltar.

Recado

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Sinto falta de você.
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E não é pouca falta.
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É muita.
.
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quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Querido diário


hoje acordei às 4:45 para ir ao NIH tentar conseguir um appointment para o meu badge (crachá). Se nos USA eu não sou ninguém sem social security number, no NIH eu não sou ninguém sem badge. E só atendem 14 pessoas por dia... Isso é a América. Nao é muito diferente do Brasil. A lot bureaucracy. Neuroses. Psicoses. Salvaguardar a segurança nacional. Um mundo de paradoxos. O metrô também tem congestionamento de trens, escadas rolantes que não funcionam, pessoas irritadas e rush hour. Mas o mais irritante do metrô de DC é a tarifa. Ela muda, dependendo do horário e de para onde voce vai. Crazy. Bem, pelo menos consegui o appointment para o badge. Agora são 8:40 e tenho que voltar às 2 PM para tirar impressões digitais. Aí vão investigar a minha vida. E se eu for uma pessoa legal, confiável, menino de família, que não sai com qualquer um, nem fica na esbórnia, pode ser que, daqui a uma semana, eu tenha um badge. Depois fui tomar café na cafeteria do building 10. Não me perco mais no Bldg 10, mas também não me aventuro mais por trilhas desconhecidas. Já sei como chegar na minha sala, no office do meu chefe, na secretária, no banheiro e na cafeteria. Por ora, é o suficiente. O café estava disgusting. Mas enfim... $7 perdidos e umas 500 calorias a mais. Ando meio deprimido, mas dizem por aí que é normal. Nessas horas eu me lembro do elevador profeticamente repetindo "going down, going down, going down". Pelo menos, o elevador do meu novo prédio é mudo. Não fica torcendo pela infelicidade das pessoas. Ah, uma coisa boa: aprendi a mudar as configurações do teclado. Logo, já pude voltar a escrever no meu Português ruim. E só. Tô com sono. Morfina. Marlene chegou e disse oi. Eu respondi "olá." Sem beijinho nem abraço. Como é emocionante esta vida na América.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Maresia

anote aí:
novo endereço
californian street
northwest
wash, d.c.

tudo o que eu levo:
três malas pretas
uma bolsa vermelha
com alguns poetas
e algumas meias;
duas cadeiras
(velhas);
oito pratos, oito copos, oito xícaras;
fotografias

dormirei no chão
lendo poesia
e ouvindo maresia

antes de dormir
uma taça – não tenho taças –
um copo
de um prosecco
um cigarro
- não pode, em país civilizado só se fuma na pracinha -
okay, smoking-free

e dormirei no chão
lendo poesia
e ouvindo maresia

ouvindo a maresia
guardada no fundo
da mala
feito anestesia
dormirei
ouvindo a maresia

terça-feira, 28 de julho de 2009

Como nasce um poema?

achei um sebo otimo aqui... com uma grande estante de poesia. E achei a Bishop, " Edgar Allan Poe & the Juke-box - Uncollected Poems, Drafts and Fragments." Fantastico o livro, tem varios poemas desconhecidos dela e, no final, um conjunto de fac-similes com todos os rascunhos de "One Art" da primeira versao (que reproduzo abaixo) ate a versao definitiva, publicada no The New Yorker, na edicao de 26 de Abril de 1976.

HOW TO LOSE THINGS? / THE GIFT OF LOSING THINGS

One might begin by losing one's reading glasses
oh 2 or 3 times a day - or one's favorite pen.

THE ART OF LOSING THINGS

The thing to do is to begin "mislaying".
Mostly, one begin by "mislaying":
keys, reading-glasses, fountain pens
- these are almost too easy to be mentioned,
and "mislaying" means that they usually turn up
in the most obvious place, although when one
is making progress, the places grow more unlikely
- This is by way of introduction. I really
want to introduce myself. I am such a
fantastic lly good at losing things
I think everyone shd. profit my experiences.

You may find it hard to believe, but I have actually lost
I mean lost, and forever, two whole houses,
one a very big one. A thir house, also big, is
at present, I think "mislaid" - but
maybe it's lost too. I won't know for sure for some time.
I have lost one peninsula and one island.
I have lost - it can never be has never been found -
a small-sized town on that same island.
I've lost smaller bits of geography, like
a splendid beach, and a good-sized bay.
Two whole cities, two of the
world's biggest cities (two of the most beautiful
although that's beside the point)
A piece of a continent
and one entire continent. All gone, gone forever and ever.

One might think this would have prepared for me
for losing one average-sized not exceptionally
beautiful or dazzling intelligent person
(excepto for blues eyes)
But it doesn't seem to have, at all...

a good piece of one continent
and another continent - the whole damned thing!
He who lose his life, etc. - but he who
loses his love - never, no never never never again.

domingo, 26 de julho de 2009

Muito, muito suspeito...

Primeiro post daqui, do mundo de ca. Atualizacao para os amigos que leem o blog. O teclado do laptop emprestado que eu uso nao deixa que eu acentue as palavras. Estou feliz por ter trazido o maximo possivel de livros. Ontem levei duas horas na imigracao. Alguem, no consulado americano, assinou um dos meus formularios com caneta vermelha. Segundo o funcionario da imigracao, isso eh muito, muito, muito suspeito (resquicios do anti-comunismo?). Quase perdi a conexao Miami-DC por causa disso. Nao perdi. Mas cheguei cinematograficamente com o portao de embarque fechando, apos ter berrado com cada pessoa que tentava barrar meu caminho "I have a flight in 10 minutes!". Mas o mais engracado mesmo foi na alfandega, logo apos ter sido liberado pela imigracao. O cara viu a minha bagagem e perguntou, "Is your family travelling with you?". Eu respondi que nao, a bagagem era toda minha mesmo. Ele respondeu que isso era muito, muito, muito suspeito. E me mandou ir ateh o oficial que passava as malas no raio-x. Eu berrei mais uns "I have a flight in 10 minutes" e para minha sorte, o oficial, que era jovem, bonito e simpatico, nao me achou muito suspeito, apesar das muitas malas e do visual rock 'nd roll. No balcao da AA encontrei uma boa alma que me levou pela entrada de funcionarios ateh o local para despachar a bagagem e depois me deixou proximo a entrada do portao de embarque. E5 seria o meu portao. De um lado estavam o E4, seguido do E6. Do outro o E3, seguido do E7. Onde foi parar a porra do E5??? Apos correr de um lado para o outro umas tres vezes, um funcionario do aeroporto, achou aquilo muito, muito, muito suspeito e perguntou o que estava havendo. Expliquei a situacao e ele me mostrou o E5, que ficava atras de uma pilastra enorme. Sai correndo, o portao de embarque automatico estava fechando, jah pela metade, e eu berrando "don't close the gate!" Fui o ultimo a embarcar. Quase quatro horas depois, estava em DC. Dessa vez ninguem me achou muito suspeito e jah no baggage claim encontrei uma cara conhecida. Ufa, cheguei! Foi tudo o que consegui pensar ateh agora.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Definições XVI

.
Mudança é quando seu lugar no mundo muda de lugar. Por um instante perde-se o eixo. Às vezes achá-lo de novo demora. Às vezes, ele some definitivamente e aí é preciso construir um novo eixo. Isso dá trabalho e dói. É quando a morfina ajuda. O problema maior de perder o eixo é que para construir um novo, é preciso deixar coisas e pessoas pelo caminho - nem tudo pode ser enrolado em plástico bolha e acondicionado em caixas de papelão. O que nem importa tanto, se com o novo eixo pronto, você souber navegar na direção certa.

Ouvindo...



Seu Pensamento
(Adriana Calcanhotto)

A uma hora dessas
por onde estará seu pensamento
Terá os pés na pedra
ou vento no cabelo?

A uma hora dessas
por onde andará seu pensamento
Dará voltas na Terra
ou no estacionamento?

Onde longe Londres Lisboa
ou na minha cama?

A uma hora dessas
por onde vagará seu pensamento
Terá os pés na areia
em pleno apartamento?

A uma hora dessas
por onde passará seu pensamento
Por dentro da minha saia
ou pelo firmamento?

Onde longe Leme Luanda
ou na minha cama?

terça-feira, 21 de julho de 2009

Manual de Funcionamento do Gato - FAQ

(para o Gato de Alice)

1. O gato está miando. O que isso significa?
De manhã quase sempre é comida. À noite é prá bater papo ou você esqueceu de limpar a caixinha (é só tirar o cocô e trocar areia quinzenalmente - Gatto's Bianco)

2. Não encontro o gato. Onde ele está?
Verifique nessa ordem: debaixo da cama, atrás da cortina, dentro do box do banheiro, dentro dos armários, dentro da gaveta mais baixa na cozinha. Só então se desespere.

3. Acabou a ração. Posso dar leite ou outro alimento?
NÃO. Nunca. Tudo que o gato come sai por algum lugar. Pense nisso antes de alimentá-lo.

4. Ainda tem ração no pote mas o gato não come. Por que?
Você encheu demais o pote da última vez. O cheiro acabou. Misture ração nova e não encha tanto da próxima vez. Royal Canin Persian 32 custa caro, não desperdice.

5. O gato soltou um negócio estranho e amarelo pela boca. O que eu faço?
O negócio estranho chama-se bola de pelos. Escove o gato três vezes por semana. Dê pasta de malte diariamente. Se não resolver: tosa.

6. Encontrei excrementos fora da caixinha. O que isso significa?
Que existe mais alguém além do gato na casa. O gato jamais deixa de usar a caixinha.

7. São 3:45 e o gato está miando. O que eu faço?
Jogue uma almofada nele e ele entenderá o recado. Lembre-se que é normal que o gato fique agitado à noite.

8. O gato está chorando. Por que?
É remela. Tire com papel ou cotonete (operação diária...).

9. Quando eu pego o gato no colo ele me arranha. O que fazer?
Corte as unhas (só as pontinhas).

10. O gato faz barulhos estranhos. O que isso significa?
Existem vários tipos de barulhos. Você aprenderá logo a reconhecê-los. Os mais importantes são:
limpeza das patas pós-cocô; uivo pré bola de pelos; uso do arranhador.

11. Posso levar o gato para passear?
Tente uma vez e depois me responda.

12. Com que freqüência devo dar banho no gato?
Nenhuma. Quando for preciso você vai saber.

13. Vou sair. E o gato?Negrito
O gato funciona sozinho. É só deixar comida e água em boa quantidade e deixar a janela entreaberta.

domingo, 19 de julho de 2009

Sobre Uma Arte

Releio um poema
querido
que me lembra:

"- A arte de perder não é nenhum mistério."*

Triste dizer
que perder só é fácil
em poema

Em prosa,
perder é sim
algo muito sério

Por isso o sorvete
de morfina existe
para que perder

seja menos triste e
sem dor eu aprenda
a perder em poema

Para que eu aprenda
a perder sem fazer
da perda prosa

Sem fazer da perda
prosa eu consiga
entender a sério

Por que a arte de
perder não é
nenhum mistério

(* verso de "Uma Arte" de Elizabeth Bishop, tradução de Paulo Henriques Britto)

sábado, 18 de julho de 2009


.
Esquadros
(Adriana Calcanhotto)
.
Eu ando pelo mundo
Prestando atenção em cores
Que eu não sei o nome
Cores de Almodóvar
Cores de Frida Kahlo
Cores!
.
Passeio pelo escuro
Eu presto muita atenção
No que meu irmão ouve
E como uma segunda pele
Um calo, uma casca
Uma cápsula protetora
Ai, Eu quero chegar antes
Prá sinalizar
O estar de cada coisa
Filtrar seus graus...
.
Eu ando pelo mundo
Divertindo gente
Chorando ao telefone
E vendo doer a fome
Nos meninos que têm fome...
.
Pela janela do quarto
Pela janela do carro
Pela tela, pela janela
Quem é ela? Quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado
Remoto controle...
.
Eu ando pelo mundo
E os automóveis correm
Para quê?
As crianças correm
Para onde?
Transito entre dois lados
De um lado
Eu gosto de opostos
Exponho o meu modo
Me mostro
Eu canto para quem?
.
Pela janela do quarto
Pela janela do carro
Pela tela, pela janela
Quem é ela? Quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado
Remoto controle
.
Eu ando pelo mundo
E meus amigos, cadê?
Minha alegria, meu cansaço
Meu amor cadê você?
Eu acordei
Não tem ninguém ao lado...
.
Pela janela do quarto
Pela janela do carro
Pela tela, pela janela
Quem é ela? Quem é ela?
Eu vejo tudo enquadrado
Remoto controle

terça-feira, 14 de julho de 2009

O Frenesi de Junho

Por incrível que pareça o frenesi de junho não foram os livros. Foi a estante. Eu sempre tive tantos livros e nunca tive uma estante. Agora eu tenho. Por poucos dias. Logo, voltarei a ter livros sem estante. Empilhados. Desorganizados. Muito usados e relidos. Por esse breve espaço de tempo há a prateleira dos poetas, a dos filósofos, a dos velhos e dos novos brasileiros, a de Borges e a de Clarice. Simone de Beauvoir olha para um horroroso Jean Paul-Sartre com um cachimbo - téte-a-téte. O amor é cego. Mário Quintana bate papo com Drummond. Bandeira elogia Vinícius e Ferreira Gullar, ainda jovem, não se sente parte do grupo e insiste em ficar caindo de lado. Foucault, por algum motivo obscuro, foi parar em cima da Lógica da Pesquisa Científica. Daqui, de onde escrevo, não consigo enxergar Platão, mas sou insistentemente observado por Freud em vinte e quatro volumes que gritam: análise! análise! análise! As lésbicas modernistas estão deprimidas e se reuniram do outro lado, viradas para o piano. Gertrude Stein talvez não tenha gostado de virar poema. Ou talvez seja porque não gostam de ver meninos dormindo pelados. E Clarice, de ponta-cabeça, que me olha com uma cara séria, como quem diz: tá me lendo? por quê? tá achando que me entende? Eu digo a eles que aproveitem a mordomia e conforto da estante. Aproveitem o direito de ter um lugar só seu, especialmente seu, mesmo que seu por acaso. Em breve só verão o fundo do malão preto e sem graça, sem ar e sem vida. E quando voltarem a respirar, estarão todos - inclusive eu - muito longe de casa. Sem problemas. A dona do iceberg imaginário por um instante se vira e me lembra que a arte de perder - por mais sério que possa parecer - não é nenhum mistério.