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domingo, 18 de abril de 2010

Recordações de viagem

a última lembrança

para o poema uma história

triste o menino que espirrou

mais forte que deveria e caiu

no precipício ao entardecer

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Nova Canção do Exílio

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Fui no Itororó beber água mineral
Petrópolis.
Não achei.

Só tinha Perrier
e Cherry Coke Diet

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

O Frenesi de Agosto


Com muito desgosto, imensa saudade, coração apertado e um pouco de esperança no bolso, começou agosto. Sem casa, sem gato, sem piano, sem amor, sem amigos. O Bloco do Eu Sozinho saiu comigo mesmo. Mesmo sem nada concreto, fui atrás dos poetas. Eles mudaram de língua. Só falam comigo em Inglês. E esperam que responda à altura. Bishop. Yeats. Keaton. Dickson. Whitman. Antes de achar uma casa, achei um sebo (oba!) e uma boa livraria. Requisitos fundamentais para quem não gosta de comprar livro pela internet. Não foi difícil encontrar um lugar para morar. 2144 California St NW. Onde mais poderia morar senão na unica saída do metrô onde está gravado um verso de um poeta? "I celebrate myself, and sing myself, and what I assume you shall assume. For every atom belonging to me as good belongs to you." Difícil foi conter as saudades da Rua Tonelero, da esquina do metrô, da academia lotada, do sorvete de amarena da esquina da Santa Clara, do Café no Santa Satisfação. Dos amigos. Dos amigos. Dos amigos. Do seu sorriso e das suas mensagens no final do dia também. Do miado chato do meu gato pardo quando acorda com a cara amarfanhada. Do som do meu piano com seu dó mais grave desafinado e um leve soar metálico quando tocava Debussy. Viagens e surtos. Sagalusa e o Diário de Camus. Em alguns momentos confesso que surtei. Descobri a definição de estrangeiro. Fiquei assustado. Nada que o correr dos dias e as saídas noturnas não amenizassem. E com uma casa nova tudo ficou mais fácil. Depois, conseguir móveis. Finalmente as malas desfazem-se. Os livros aparecem. Tudo fica mais familiar, embora ainda falte muita coisa para chamar isso de lar. Não sei porque, mas o diabo mora nos detalhes vermelhos da minha sala. De vez em quando a gente conversa. Ele avisa: fica tranquilo que essa nova vida está só começando; vem muito mais por aí.
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sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Asas

no meio de mim
mora um ser alado
que toda hora
tenta sair

antes eu dizia:
sai, meu filho
voa!

agora?

não deixo.
não deixo.
não deixo.

quer voar?
me leva junto.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Definições XVII

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Estrangeiro é quando você olha para o lado e não reconhece nada nem ninguém. É uma sensação de infinita solidão - difícil explicá-la - e que é sempre qualitativa: não depende de quanta gente tem por perto, mas de quem está ao seu redor. O estrangeiro é um estado, não é um ser. Ninguém é estrangeiro ou fica estrangeiro por toda a vida. Aos poucos o corpo começa a aceitar o novo mundo, a ouvir novas palavras, ver gente nova e reconhecer tudo isso como parte dele. Dói, demora, requer paciência. Até que um dia você vê numa porta escrito "push" e ao invés de puxar, você empurra e entra.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

O Frenesi de Julho

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Se o frenesi não fosse literário, mas sexual, julho teria sido um orgasmo múltiplo. Não que tenha sido recheado de leituras excitantes - não li quase nada. Mas foi tanta coisa ao mesmo tempo que ainda estou meio atordoado. Flip. Paraty antes de partir para lembrar. Manuel Bandeira. Uma semana só na companhia de amigos, livros, música e sonhos. Quem precisa de algo mais? Sorvete de morfina. Um biscoito da sorte chinês e profético. Muitos livros na bagagem de volta. Metade do peso devia-se ao Lobo Antunes. Como é belo o Lobo Antunes. E profundo e poético e infinitamente belo. A outra metade a alguns poetas. Companheiros de viagem. Mal deu tempo de desfazer a mala de Paraty - desfazer não, porque não desfaço malas. Elas que desfazem-se sozinhas. Viram pó. Mal as malas desfizeram-se e já era hora de reunir o pó novamente. Despedidas. Despedidas. Despedidas. Eu odeio despedidas. Eu não sei partir. Não aprendi a lição com o aeroporto - talvez por nunca ter morado perto de um. Não sei partir sem medo, sem remorso, sem saudade. Mas só chorei duas vezes. Sou econômico no choro. A primeira, quando me despedi de meus pais. A segunda, lendo um poema para alguém que, sem querer, mas muito feliz, acabei por amar. Aquele mesmo poema sobre a arte de perder, que volta e meia bate na minha porta. A última semana foi difícil. Dizer adeus. Reunir meus pedaços mais íntimos e enfiar numa mala (três...) até não caber mais uma migalha. Tentar, em vão, carregar tudo. Não cabe nas malas e dá vontade de chorar mais. Mas o choro não vem e tanta coisa precisa ser feita que não há tempo para chorar. Último compromisso no Rio: consulta com a astróloga. Uma amiga me diz que "eu fui à astróloga" é uma frase incompatível com a minha boca. Mas eu fui. Juro. E ela mandou eu parar de sofrer. Meu mapa natal aponta para o sucesso e a felicidade. É só não atrapalhar. Chega o dia. Correria. Mal dá tempo de pegar mais uns livros, tocar uma última música ao piano (e lembrar de quando só havia a música e nada mais importava), dizer adeus aos amigos mais queridos. Ia deixar uma carta de boas vindas para o Gato de Alice, num envelope amarelo, mas não deu tempo. Nem de dizer o quanto ele mudou a minha vida. Olho para Borges e eu sei que ele sabe que eu estou indo e que dessa vez, quando a porta fechar, eu não vou voltar por um longo tempo. Ele me olha com seus olhos amarelos e severos. Nós nos entendemos por olhares e miados desde o primeiro dia. Diz que não me preocupe e que cuidará de tudo até eu voltar.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Maresia

anote aí:
novo endereço
californian street
northwest
wash, d.c.

tudo o que eu levo:
três malas pretas
uma bolsa vermelha
com alguns poetas
e algumas meias;
duas cadeiras
(velhas);
oito pratos, oito copos, oito xícaras;
fotografias

dormirei no chão
lendo poesia
e ouvindo maresia

antes de dormir
uma taça – não tenho taças –
um copo
de um prosecco
um cigarro
- não pode, em país civilizado só se fuma na pracinha -
okay, smoking-free

e dormirei no chão
lendo poesia
e ouvindo maresia

ouvindo a maresia
guardada no fundo
da mala
feito anestesia
dormirei
ouvindo a maresia

domingo, 26 de julho de 2009

Muito, muito suspeito...

Primeiro post daqui, do mundo de ca. Atualizacao para os amigos que leem o blog. O teclado do laptop emprestado que eu uso nao deixa que eu acentue as palavras. Estou feliz por ter trazido o maximo possivel de livros. Ontem levei duas horas na imigracao. Alguem, no consulado americano, assinou um dos meus formularios com caneta vermelha. Segundo o funcionario da imigracao, isso eh muito, muito, muito suspeito (resquicios do anti-comunismo?). Quase perdi a conexao Miami-DC por causa disso. Nao perdi. Mas cheguei cinematograficamente com o portao de embarque fechando, apos ter berrado com cada pessoa que tentava barrar meu caminho "I have a flight in 10 minutes!". Mas o mais engracado mesmo foi na alfandega, logo apos ter sido liberado pela imigracao. O cara viu a minha bagagem e perguntou, "Is your family travelling with you?". Eu respondi que nao, a bagagem era toda minha mesmo. Ele respondeu que isso era muito, muito, muito suspeito. E me mandou ir ateh o oficial que passava as malas no raio-x. Eu berrei mais uns "I have a flight in 10 minutes" e para minha sorte, o oficial, que era jovem, bonito e simpatico, nao me achou muito suspeito, apesar das muitas malas e do visual rock 'nd roll. No balcao da AA encontrei uma boa alma que me levou pela entrada de funcionarios ateh o local para despachar a bagagem e depois me deixou proximo a entrada do portao de embarque. E5 seria o meu portao. De um lado estavam o E4, seguido do E6. Do outro o E3, seguido do E7. Onde foi parar a porra do E5??? Apos correr de um lado para o outro umas tres vezes, um funcionario do aeroporto, achou aquilo muito, muito, muito suspeito e perguntou o que estava havendo. Expliquei a situacao e ele me mostrou o E5, que ficava atras de uma pilastra enorme. Sai correndo, o portao de embarque automatico estava fechando, jah pela metade, e eu berrando "don't close the gate!" Fui o ultimo a embarcar. Quase quatro horas depois, estava em DC. Dessa vez ninguem me achou muito suspeito e jah no baggage claim encontrei uma cara conhecida. Ufa, cheguei! Foi tudo o que consegui pensar ateh agora.

terça-feira, 14 de julho de 2009

O Frenesi de Junho

Por incrível que pareça o frenesi de junho não foram os livros. Foi a estante. Eu sempre tive tantos livros e nunca tive uma estante. Agora eu tenho. Por poucos dias. Logo, voltarei a ter livros sem estante. Empilhados. Desorganizados. Muito usados e relidos. Por esse breve espaço de tempo há a prateleira dos poetas, a dos filósofos, a dos velhos e dos novos brasileiros, a de Borges e a de Clarice. Simone de Beauvoir olha para um horroroso Jean Paul-Sartre com um cachimbo - téte-a-téte. O amor é cego. Mário Quintana bate papo com Drummond. Bandeira elogia Vinícius e Ferreira Gullar, ainda jovem, não se sente parte do grupo e insiste em ficar caindo de lado. Foucault, por algum motivo obscuro, foi parar em cima da Lógica da Pesquisa Científica. Daqui, de onde escrevo, não consigo enxergar Platão, mas sou insistentemente observado por Freud em vinte e quatro volumes que gritam: análise! análise! análise! As lésbicas modernistas estão deprimidas e se reuniram do outro lado, viradas para o piano. Gertrude Stein talvez não tenha gostado de virar poema. Ou talvez seja porque não gostam de ver meninos dormindo pelados. E Clarice, de ponta-cabeça, que me olha com uma cara séria, como quem diz: tá me lendo? por quê? tá achando que me entende? Eu digo a eles que aproveitem a mordomia e conforto da estante. Aproveitem o direito de ter um lugar só seu, especialmente seu, mesmo que seu por acaso. Em breve só verão o fundo do malão preto e sem graça, sem ar e sem vida. E quando voltarem a respirar, estarão todos - inclusive eu - muito longe de casa. Sem problemas. A dona do iceberg imaginário por um instante se vira e me lembra que a arte de perder - por mais sério que possa parecer - não é nenhum mistério.