o trânsito da grajaú-jacarepaguá
jaleco branco com doutor bordado em verde
pela última vez
apitos. monitores. bombas. ventiladores.
música de cti
.
lembra-se da primeira parada: assistolia
massagem. adrenalina. massagem.
aprender a massagear corações
o primeiro tubo. a primeira subclávia.
angústia e medo de não saber o que fazer.
quem vai drenar o pneumotórax?
.
dar a notícia
é sempre o pior.
não é.
demonstrar pesar que não existe
por um desconhecido.
isso é pior.
medo de fazer demais e prolongar
o inevitável.
ser médico é aprender a manejar o medo.
sempre há medo
.
hoje há um menino morrendo.
os olhares mudam
quando há meninos morrendo.
alguém pergunta:
- e o menino do leito seis? nada a fazer?
nada a fazer - confirmo.
ver alguém morrer é uma experiência única.
as vidas podem ser diferentes
mas a morte é sempre igual.
o corpo desiste aos poucos
.
quase amanhecendo.
leito quatro
taquicardia supraventricular
não lembro
ligar para um amigo
- o que fazer?
- já tentou adenosina?
- já. instável.
- choque. choque. choque.
- voltou, sinusal.
.
sete e meia
passo o plantão.
vou embora.
sei que estou vivo
mas me sinto
meio morto.
morfina
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terça-feira, 23 de junho de 2009
sexta-feira, 2 de janeiro de 2009
Memórias

Nacib Daher. Quinto filho de um casal recém-imigrado de Richmaya, no Líbano, para o Brasil, no final do século XIX. Honestamente, lembro-me de poucos momentos com meu bisavô. O sobrado. Ele, baixinho, sorrindo, sentado na cadeira da varanda, assobioando com os passarinhos. Curiós e canários. Ele, na casa da praia, brincando comigo no balanço improvisado na amendoeira. Tinha um rosto enigmático - ao menos para mim. Eu e minha prima brincando no balcão da loja. Falava baixo. Sempre. Quase sempre. Havia a Lyra de Arion. Ele amava a música. Definitivamente, algumas coisas passam de pais para filhos. O dia do velório. O silêncio. Mas ele amava a música! Hoje só haverá silêncio. Memórias. Impressões. Sugestões. Restaram os sonhos, quando ele ainda canta baixinho, acompanhando um último canarinho.
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