de chegar à janela, espiar a rua.
.
Nenhum passante veja o instante
em que a janela se oferece
para emoldurar o morador.
.
De onde surgiu, de que etérea
paragem, nublado sótão,
como pousou, quedou ali,
recortado na penumbra?
.
Modo particularíssimo de ficar
e não ficar ao mesmo tempo
debruçado à jnaela
diante de segunda-feira
e das eternidades da semana.
De frente? De lado? De nenhum
ângulo? Está e não está
presente, é ilusão de pessoa,
vaso-begônia, objeto que mofou,
exposto no ar?
.
A janela e o vulto imobilizado
proibem qualquer indignação.
.
Carlos Drummond de Andrade
(Boitempo, in Poesia Completa, Ed. Nova Aguilar, 2006)
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